2 de jul. de 2011

Eu li, e você?

TIRE-A DA CABEÇA

Você estava apaixonado por alguém e
levou um fora. Acontece mais do que
acidente de avião, desastre com
romeiros e incêndio na floresta.
Corações partidos é o grande drama
nacional. O que fazer? Ainda não
lançaram um manual de auto- ajuda
que consiga eliminar nossa fossa, e
dos amigos só podemos esperar uma
frase, repetida à exaustão: tire esse
garota da cabeça. Parece fácil. Mas
alguém aí me diga: como é que se tira
alguém de um lugar tão cheio de
mistérios?

Gostar de alguém é função do
coração, mas esquecer, não. É tarefa
da nossa cabecinha, que aliás é nossa
em termos: tem alguma coisa lá
dentro que age por conta própria,
sem dar satisfação. Quem dera um
esforço de conscientização resolvesse
o assunto: não gosto mais dela, não
quero mais saber daquela prepotente,
desapareça, um, dois e já !
Parece que funcionou. Você sai na rua
para testar. Sim, você conseguiu:
olhou vitrines, comeu um sorvete e
folheou duas revistas sem derramar
uma única lágrima. Até que começa a
tocar uma música no rádio e desanda
a maionese. Você não tirou coisa
alguma da cabeça, ela ainda está lá,
cantando baixinho para você.

Táticas. Não ficar em casa relendo
cartas e revendo fotos. Descole uma
festa e produza-se para matar. Você
bem que tenta, mas nada sai como o
planejado. Os casais que se beijam ao
seu lado são como socos no
estômago. Você se sente uma
retardada na pista de dança. Uma
menina puxa papo com você e tudo o
que ela diz é comparado com o que o
sua ex diria, com o que a sua ex faria.
Chamem o EccoSalva.

Livros. Um ótimo hábito, mas em vez
de abstrair, você acha que tudo o que
o escritor escreve é para você em
particular, tudo tem semelhança com
o que você está vivendo, mesmo que
você esteja lendo sobre a erupção do
Vesúvio que soterrou Pompéia .
Viajar. Quem vai na bagagem? Ela.
Você fica olhando a paisagem pela
janela do ônibus e só no que pensa é
onde ela estará agora, sem notar que
ela está ali mesmo, presa na sua
mente.

Livrar-se de uma lembrança é um
processo lento, impossível de
programar. Ninguém consegue tirar
alguém da cabeça na hora que quer,
e às vezes a única solução é inverter o
jogo: em vez de tentar não pensar na
pessoa, esgotar a dor. Permitir-se
recordar, chorar, ter saudade. Um dia
a ferida cicatriza e você, de tão
acostumada com ela, acaba por
esquecê-la. Com fórceps é que a
criatura não sai.

Martha Medeiros

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